Marcos Pereira on-line

28 outubro 2004

Carta ao incauto(a) internauta - Avant Première do blog

Dileto(a)(s),


Sem mais delongas, criei este blog por 3 principais motivos:

1) Pelo simples prazer de escrever, elaborar idéias, instigar, comunicar. Enfim, brincar com as possibilidades oferecidas pela palavra escrita.

2) Para comentar e expressar a opinião particularizada da minha própria pessoa, enquanto eu mesmo, no que tange ao mundo do entretenimento, principalmente música, cinema e TV.

3) Para registrar pensamentos que pululam na minha cabeça. Temas a princípio triviais mas que, dependendo do enfoque, podem sugerir ou revelar algo além. Lembrando Fox, o Molder do "Arquivo "X", "a verdade está lá fora". Ou não!

Concluindo, deputado, pretendo transitar por assuntos diversos. Paulatinamente (adoro este advérbio) vou adicionar os textos antigos que considero interessantes para serem compartilhados.

Sem mais para o momento, despeço-me atenciosamente.

Marcos Pereira on-line

E VIVA ZAPATA!!!


27 outubro 2004

De como a gula derruba um aspirante a atleta - Meia-maratona do Rio 2004

Pois bem! Fim de semana prolongado, feriadão de 7 de setembro. E lá fui encarar a minha segunda meia-maratona do Rio. Ao contrário do ano passado, neste ano eu corri mais com o coração que propriamente com as pernas. De fato, este ano relaxei um pouquinho na preparação. Não me contive às tentações da gula e também me entreguei aos enebriantes prazeres vinículos do deus Baco.

Contagem regressiva. Quinta-feira, 02 de setembro. Comecei o dia comendo um enorme e calórico pastel especial – aquele que tem até ovo cozido dentro, uma metade em cada banda. Na sexta, dia 03, vasculhando a geladeira, deparei-me com uma pizza de pepperoni. Para acompanhar, nada melhor do que o Santa Ana, aquele vinho argentino que custa por volta de R$ 6,90 no Extra. Atualmente a melhor relação custo-benefício dentre os vinhos importados. Bom, a corrida seria só no domingo. Uma pedaço de pizza não faria mal algum. Afinal eu ainda teria o sábado para me recuperar.

Sábado, 04 de setembro de 2004, 7:11h. Chego ao Rio, o tempo estava meio encoberto, sujeito a chuvas e trovoadas. Algumas coisas no Rio soam estranhas para um paulista. É um misto de descontração que às vezes descamba para a informalidade exagerada. Exemplo, perguntei no terminal se o ônibus estacionado passava pelo aterro do Flamengo. O motorista respondeu que iria perguntar ao fiscal. Ou seja, dependendo de algumas conjecturas do trânsito, os itinerários dos ônibus são alterados. Isto lembra-me o princípio da incerteza de Heinseberg (Atomística, Química, lembra?). Não é possível determinar, com a exatidão, a posição do elétron no átomo. Naquela não-linha de ônibus, não é possível determinar onde ele pode estar na cidade. Enfim, o fiscal definiu o trajeto e, para a minha sorte, incluía o aterro do Flamengo, local da minha estadia, a casa da Patrícia e da sua filha, a Priscila, que agora conta com os seus doces e indeléveis 17 aninhos. Aliás, ela é a minha melhor amiga de 17 anos, que mora no Rio.

Fui apresentado ao Marco, o namorado da Patríca, que é do País de Gales (esqueci de perguntar qual a nacionalidade de quem nasce lá! Galês? Não, acho que não. Galês deve ser da Galícia. Galeano? Não, este foi um jogador do Palmeiras). Gente boa o cara. Senso de amor sutil, inteligente e impiedoso, típico dos britânicos. E mais, ele manda muito bem na cozinha. Eu iria manerar na alimentação. Mas, o meu intento não resistiu a uma sensacional comidinha caseira, incrementada com uma receita de legumes ao forno simples e deliciosa. E para completar, regado a um legítimo chileno Concha Y Toro, o meu vinho favorito. Sensacional!

E a dieta pré-corrida, onde ficou nesta história? Calma, eu ainda teria a tarde e a noite para me recuperar. Aí começou o meu drama silencioso: uma revolução químico-estomacal desarranjou o meu sistema digestivo. Como assim? Só pode ter sido aquela pera que eu comi depois do almoço. Não me caiu bem. Decidi que ficaria só a base de bolacha (no Rio eles falam biscoito) e sucos.

Gentilmente, a Pri-17-RJ foi dormir com a sua mamãe e ofereceu o seu quarto para eu dormir. Adoro quarto de adolescentes-meninas. Cheios de artefatos, almofadas transadas, bichinhos fofinhos, cores e mais cores. Apaguei as luzes e assim que me deitei, um céu estrelado acendeu no teto. Explico, o quarto é ornamentado com aqueles decalques fosforescentes em formas astrais, que refletem luz e brilham no escuro.

Domingo, 05 de setembro de 2004, 7:07h, dia de corrida. Que noite agradável foi aquela! Sonhei muito! Só que não lembrei de nada. A sensação é de que foram sonhos intensos, grandiosos, com tramas dignas de um filme épico. É chegada a hora de ir para São Conrado, local de largada. Encontrei o Luis Augusto, companheiro de algumas caminhadas, que estava fazendo um tour com a namorada (fotógrafa de plantão, a doce Raquel) e, de quebra, havia se inscrito na corrida . Aqui cabe um parênteses. O L.A é uma figura à parte. Sem preparação específica, ele vai lá e corre. Deste jeito, digamos, heterodóxico, ele já acumula no curriculum duas maratonas completadas e outras meias-maratonas. Se em alguns trechos ele cansa, pára até se recuperar e volta a correr, no ritmo dele, sem stress. Mais que uma estratégia de corrida, este jeito tranquilo de encarar uma situação se revela um estilo de vila.

O clima estava meio cinzento, como no dia anterior. Incrível! E não é que a meteorologia acertou de novo? Como previsto, o sol abriu e sorriu para o Rio. Começa a corrida. Para nós, os 99,7% participantes-coadjuvantes, a corrida começa efetivamente uns 10, 15 minutos depois. Em tempos de internet, emparelhei lado a lado com uma bela moça malhada, desfilando na avenida a beira-mar o seu iPod super fashion.

Quanto à minha performance, paguei pela boca . Flatulento, nos primeiros 7,57 Km, segui num ritmo leve. Até os 15,37 Km eu fui pianinho, percebendo que abusara na alimentação. A partir do Km 18,11 as pernas gradativamente começaram a me faltar. O que fazer? Glicose na veia, ou melhor, Hershey´s na boca. Diante daquele céu azul, o céu da minha boca, adocicado pelo chocalate, me manteve ativo. Paulatinamente (adoro este advérbio) começo a ressurgir das cinzas e, impulsionado por um clarinetista que tocava "Chariots of Fire" (o cara lembrava o “Gengivas Sangrentas” dos Simpsons), o corpo se recuperou e começou a (cor)responder satisfatoriamente aos comandos do cérebro. Daí para o Km 21 cheguei pela inércia do movimento.

Missão cumprida e coooooomprida. Rio, I´ll see ya next year, for sure!!!


P.S. Como diria o padre Quevedo, sinal vermelho é uma coisa que não existe (pronuncia-se "ekziste", no Rio). Os motoristas simplesmente o ignoram.

P.S. II: Dias depois, voltei a participar de outra prova. Desta vez foi a maratona de revezamento Pão-de-Açúcar. A escrita se repetiu. Na véspera da corrida comi uns acarajés irados, patrocinados pelo casal soteropólito-paulista Eugênio/dona Marly e pelo anfitrião Cássio-Arrelia. O desempenho na corrida? Sem comentários!

24 outubro 2004

Despedidas e não-despedidas


Uma idéia original, um roteiro levemente não-linear, atores aparentemente escalados inapropriadamente para os papéis e uma pérola musical regravada pelo Beck fazendo a trilha sonora. Tudo isto, batido no liquidificador, e o resultado é o sensacional filme “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”. Ah! A música é “Everybody’s Gotta Learn Sometimes”. O Beck imprimiu uma doçura impressionante à (já) melosa balada, sucesso do Korgis, que tocava incessantemente na Difusora (AM 960 Khz, São Paulo), no início dos anos 80.

Vamos dar nomes aos bois. Os atores são o Jim Carrie, conhecido pela sua verve cômica, e a titânica atriz Kate Winslet. O argumento é o seguinte: ela é extrovertida, ele, contido. Eles se apaixonam, se enamoram e rompem o relacionamento. Ele sofre e, ao procurá-la para tentar reatar, não entende a indiferença com que ela o trata, como se não o reconhecesse. E não reconhece mesmo! Isto porque ela foi submetida a uma “cirurgia” que eliminou as lembranças dele no cérebro dela. Na véspera do Valentine´s day (dia dos namorados), ele descobre a “cirurgia mágica” e faz o mesmo. Paro por aqui. A trama é envolvente e as peças do quebra-cabeça se encaixam no final numa seqüência bem legal.

Li por aí que o roteirista do filme é o mesmo do non-sense “Quero ser John Malcovich”. De novo ele acertou a mão em cheio. E, de pano-de-fundo, toca em algumas questões instigantes. Inclusive uma delas foi “pauta” de uma sessão superinteressante de terapia: a não-despedida. A tese era sobre a necessidade de se marcar um fim, após uma separação. Antes uma despedida realizada, ainda que dolorosa, que fantasmas persistentes a vagar pelo inconsciente. A despedida encerra um período, a passagem de uma, algumas ou várias pessoas pelas nossas vidas. E, por que não, de renovação? A sobrevivência das espécies não estaria diretamente ligada à capacidade de adaptação e mutação e, conseqüentemente, da renovação?

Teorias de Darwin à parte, o filme me fez lembrar da música “Encontros e Despedidas”, tema da novela das 8 na (desanimada) releitura da Maria (ir)Rita para a música do Milton Nascimento, gravada primeiramente pela Simone no LP Corpo e Alma, em 1981. Nesta época eu morava em Santos e os meus primos de São Paulo passavam as férias lá e, vice-versa, a minha família subia a serra. Na despedida, era aquele aperto no peito. Calhou de uma destas despedidas coincidir com o sucesso da música no rádio. A música, como de costume, ditava a marcação do ritmo da vida.

Mais recentemente, no meu último dia em Kamloops (Canadá), a cidade que me acolheu durante alguns meses, olhei de uma forma diferente para os mesmos lugares que compuseram o cenário daquele verão de 2001. Naquele dia eu sabia que dificilmente tornaria a vê-los. Simples cruzamentos de rua, fachadas de supermercados e fast-foods, por algum tempo fizeram parte do meu mundo. E, dali por diante, seriam apenas memórias de terras longínquas.

No bojo de toda esta questão, eis que ligo a TV e, casualmente, zapeando pelos canais, parei no GNT, que exibia o “Saia Justa” número 100. A edição comemorativa marcou a despedida da Rita Lee do programa. A Rita, com o seu estilo irreverente, fazia contraponto em relação às outras apresentadoras. Entre as várias homenagens rendidas à roqueira-mor do Brasil, a produção do programa criou um videoclipe com colagens de cenas de despedidas de vários filmes, entre eles, Dr. Jivago, ET, Central do Brasil e Procurando Nemo. E a música de fundo foi “Cartão Postal”, da própria Rita no início da carreira solo, pós-Mutantes. “Cartão Postal” é um rock com levada blues, muito bem executado pela banda que acompanhava a Rita Lee, o Tutti-Frutti. Aqui vai alguns versos: “(...) O adeus traz a esperança escondida / Pra que sofrer com despedida / Se só vai quem chegou / E quem vem vai partir (...)” . Caiu como uma luva no clipe e no clima emotivo do programa.

Mesmo nos seriados de TV é bastante comum um último capítulo. Foi assim com os seriados japoneses de monstros Ultra-Seven, Robô Gigante e Vingadores do Espaço. Também com as sitcoms Seinfeld e Friends. Ao contrário destes, o espetacular desenho animado “A Caverna do Dragão” não teve um fim e na internet circulam até hoje algumas versões conspiratórias sobre um suposto fim que não chegou a ir ao ar.

Enfim, mais doloroso que a despedida, são as reticências mudas. Ou seja, quando não há o rito e as palavras e gestos não se concretizam, ainda que num simples aceno de mão. O luto latente que não se consumou, não marcou o fim, gera uma incômoda sensação de que não foi pleno, como um coito interrompido.

The End.


P.S.I. Caloi 10 dourada, modelo Sprint. Ela não foi encostada num canto qualquer da casa, nem vendida. Ela fatidicamente foi-me subtraída. Uma das minhas maiores companheiras da adolescência, a bike dourada foi roubada num sábado à noite de 1987, no antigo Jumbo-Eletro, hoje Pão-de-Açúcar, em frente ao Posto 2, em Santos. Circulei por horas nos arredores do supermercado, sempre retornando ao local onde a havia deixado. Custei a acreditar, mas um elo da corrente que a prendia, caído no chão, denunciava o delito. A nossa convivência durou pouco mais de um ano. Tempo suficiente para cruzarmos a cidade de Santos várias vezes, de ponta a ponta, norte- sul, leste-oeste. Caloi 10 dourada, esteja onde estiver eu não a esquecerei jamais. Você foi uma extensão do meu ser, em forma de 2 rodas.

P.S.II. Meu primeiro Gradiente, modelo, DS 800. Um dos últimos da geração de aparelhos de som domésticos, com recursos tais como equalizador gráfico com ajustes independentes por faixa de freqüência e loudness. Lembro como hoje o dia em que nos vimos pela primeira vez. Os meus olhos reluziam de contentamento. Aquele era o tão sonhado aparelho de som, que eu paquerava nas vitrines das lojas. Com os meus primeiros salários de estagiário, comprei o tão desejado objeto de deleite. Quando me mudei para São Paulo, só o encontrava nos fins-de-semana, na casa da minha mãe. Em menos de 1 ano não suportei a separação e o trouxe para morar comigo em definitivo. Tudo caminhava bem até que, certo dia, recebo um telefonema do Alexandre, amigo com quem eu dividia o saudoso apartamento na rua Augusta. O apartamento fôra roubado. Aquela notícia ao mesmo tempo me deixou triste e revoltado. Passado alguns anos, não guardo mágoas. A minha esperança é que pelo menos os graves, médios e agudos emitidos pelo aparelho levem vibrações positivas para aqueles que o tiraram de mim. DS 800, o primeiro aparelho estereofônico a gente nunca esquece.

P.S. III. Uno Mille verde-água, placa BOH 9831, meu primeiro carro. Foi numa manhã de segunda. Eu subia a via Anchieta rumo a São Bernardo do Campo. Já no trecho de planalto, Km 18, saída para a cidade, amadorísticamente passei do ponto e forcei o volante para a direita, numa manobra impossível. O carro, desgovernado, acabou por tombar na curva. Dias depois recebi a triste notícia da seguradora: perda total. O moço disse que a estrutura do carro fôra muito danificada e, caso tentassem recuperá-lo, a estabilidade estaria comprometida pelo resto de suas quilometragens. Foi melhor assim. Espero que as suas peças tenham sido reaproveitadas em outras carros, fazendo outros proprietários tão felizes quanto eu fui. Por 8 meses vivemos uma intensa relação. Ele foi cúmplice de várias barbeiragens, típicas de iniciante, e me descortinou um mundo novo, com várias possibilidades nunca antes sequer cogitadas por mim. Jamais esquecerei daquele tour, em 1995, pelo litoral norte de São Paulo até a região dos Lagos, no Rio. Ali eu percebi que poderia ir muito mais além. E você, Mille, esteve comigo o tempo todo, firme, forte e robusto. Só tenho uma palavra a dizer: obrigado.