Marcos Pereira on-line

01 julho 2010

Avante, gloriosa Celeste!

A linda bandeira uruguaia

Nas recentes décadas, cada vez mais o futebol vem se tornando um ultra-hiper-mega-negócio globalizado. Futebol, enquanto esporte, é simplesmente um detalhe. Como na época do colonialismo, os países pobres exportam a matéria-prima (jogador) para as metrópoles, que por sua vez organizam e vendem o produto futebol para consumo próprio e para o mundo. Assim sendo, naturalmente os times acabam por superar as seleções nacionais. A Copa do Mundo é um reflexo disso. O que dizer do nível técnico do evento? Haja apatia, amigo! Qualquer partida das semifinais da Liga dos Campeões da Europa, ou mesmo da Copa do Brasil, é bem melhor que o melhor (?) jogo da Copa.

Mesmo não sendo um entusiasta do esporte bretão, na condição de terráqueo sul-americano, não há como fugir do assunto Copa do Mundo e tudo que vem a reboque: irritantes vuvuzelas, caricatos bafana-bafanas, etc. Até os colunistas Zé Simão e Luís Fernando Veríssimo temporariamente migraram para os cadernos de esportes de seus jornais. Tudo termina em Copa.

A fim de descobrir um algo mais, além do óbvio ululante da crônica esportiva, fui conferir os blogs para saber das ‘novidades’ do torneio. Victor Birner e PVC analisam esquemas táticos e tentam explicar um jogo que eu não consigo enxergar, tipo-assim:
. El Loco Bielsa agiu de forma insana ao colocar o Chile no ataque contra a ‘poderosa’ seleção brasileira;
. a Alemanha joga um futebol vistoso, atacando com uma linha de quatro.

A leitura caminhava para um tédio absoluto até eu me deparar com um post brilhante do Roberto Vieira, reproduzido no blog do Juca Kfouri. Pegando um gancho no sucesso dos países da América do Sul nesta Copa, o texto lembra do fracasso destes países na questão social. Em oposição, os países europeus caem pelas tabelas, mas apresentam um quadro social positivo.

Folheando o jornal, encontrei outro texto (caderno Equilíbrio, Folha de São Paulo, 30/06/2010) interessante, que aborda o tema futebol do ponto de vista da dominância de um grupo sobre outro e as conseqüências hormonais da vitória/derrota nos envolvidos direta (jogadores) ou indiretamente (torcedores) na 'batalha'.

Ah! Pra não dizer que não falei do título, torço fervorosamente para o Uruguai, a grande celeste olímpica. Em caso de derrota, segue, pela ordem, deputado(a), a minha torcida pelo Paraguai e Argentina.
E VIVA ZAPATA!
E VIVA A CELESTE OLÍMPICA!
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A Copa Mercosul
Por ROBERTO VIEIRA
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Quem diria?
A Copa do Mundo virou Copa do Mercosul.
Mercosul de veias abertas e futebol sem fronteiras.
Mercosul de Neruda, Galeano, Drummond e Borges.
Mercosul de Toro, Schiaffino, Pelé e Maradona.
Mercosul primeiro mundo no futebol.
Pois a miséria ainda habita seus grotões.
Pode ser que as semifinais não confirmem a nova geografia.
E daí?
Uma terra esquecida do mundo.
Lembrada apenas pela cana, por Potosí, pelo couro e pela subserviência.
Continua surpreendendo no maior espetáculo da Terra.
E por quê?
Antes que os arautos de uma nova ordem proclamem nossa grandeza.
Lembremos que os jogadores de futebol são pobres meninos de rua.
Com raras exceções.
Meninos que sonham tirar suas famílias da linha de pobreza.
Meninos que sonham com o trono em Madrid, Londres ou Paris.
Embora Moscou e Atenas também sirvam.
O futebol é território dos que nascem nos mocambos e vilas miseráveis.
Os garotos alemães e ingleses preferem outros brinquedos.
Os garotos suecos e dinamarqueses estudam de manhã e à tarde.
Antes de se proclamar que o Mercosul é bom de bola.
Entendam que o Mercosul é ruim de garfo e de vacina.
No dia em que o Mercosul for rico.
A Copa do Mundo muda de endereço.
Para tristeza de quem sonha com o Hexa.
E alegria de quem sonha simplesmente com justiça…
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Aos vencedores, testosterona
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Às vezes são as perguntas simples das crianças que nos dão perspectiva. Semana passada foi um "Mãe, por que tem Copa do Mundo?". Hmm. Ensaiei algo como "para descobrir qual país tem o melhor time de futebol", mas sem muita convicção; não acredito que mera curiosidade mova os bilhões de dólares envolvidos no assunto. Uma resposta melhor seria "porque seres sociais como nós adoram se meter em disputas de dominância para determinar quem manda e quem obedece". Ao ver o gramado com seus 11 representantes uniformizados de cada equipe se enfrentando, horda ululante ao redor, não consigo deixar de pensar que isso é a versão moderna, "pacífica", de um campo de batalha onde exércitos inimigos, encharcados de testosterona, defendem seus líderes respectivos (esses protegidos sobre seus cavalos, digo, bancos). A testosterona é fundamental. Esse hormônio sexual age sobre o cérebro e o impele a confrontos, deixando-o mais agressivo e disposto a correr riscos. Em embates entre humanos, e também entre camundongos, tem mais chances de vitória aquele que entrar na briga com o nível mais alto de testosterona. Disputa encerrada, quem vence leva de quebra uma dose a mais de testosterona, encomendada por seu cérebro. Seja em guerra por território, briga de rua, jogo de tênis, xadrez ou cara e coroa, a elevação da testosterona no vitorioso está ligada a atitudes de dominância, como mudanças na postura e no tom da fala, e mais agressividade. Tudo isso também aumenta as chances de o vencedor querer uma nova disputa e ainda sair vitorioso dela no que depender só dele, claro. O curioso é que a testosterona também aumenta nos fãs que veem seu time vencer, sem participar da luta. Um estudo mostrou que meros 20 minutos após o fim da Copa de 1994, decidida nos pênaltis, brasileiros que viram na TV seu país se tornar tetracampeão tiveram a testosterona elevada em 25%. Os italianos, que viram seu time derrotado, sofreram queda de 25% do hormônio. Quem ganha a batalha e a testosterona, ou apenas se identifica com o vencedor, sai de cabeça erguida, batendo no peito e querendo mais, e tem mais chance de continuar ganhando. Quem perde se recolhe e evita novas disputas. E se consola dizendo que o importante é competir.
SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de "Pílulas de Neurociência para uma Vida Melhor" (ed. Sextante) e do blog http://www.suzanaherculanohouzel.com/